Porque acho importantes as organizações do tipo “universidades seniores”?
Confesso que não morro de amores pelo nome de “universidades seniores” mas, à falta de alternativa válida, lá vou utilizando essa expressão. Não gosto do termo universidade porque estas organizações, embora devam ser pólos de troca de conhecimentos, não se destinam a formar quadros e não gosto da palavra sénior por uma questão de antipatia com o termo.
À parte estes pormenores, considero estas organizações muito importantes não tendo, a sociedade, dado, ainda, o seu merecido valor. No entanto, o movimento, porque se trata de um movimento, está em marcha e não se configura como uma moda mas sim, uma necessidade da sociedade contemporânea.
As sociedades evoluem, nem sempre no melhor sentido, e, no seu inexorável avanço criam situações a que todos temos que nos adaptar. Um dos factos mais gritantes é a alteração do modelo de núcleo familiar. O agregado familiar, pilar da sociedade, outrora unido, encontra-se hoje, devido às vicissitudes da vida contemporânea, disperso estando as gerações mais novas assoberbadas com problemas que lhes retiram o tempo para manter em bom estado de conservação a teia que constitui o agregado familiar. Longe e sem tempo disponível a teia vai-se deteorando deixando as gerações mais velhas com um problema – a solidão.
Mas será que é mesmo assim? As pessoas, ao longo da sua vida de estudo, de trabalho, etc. não fizeram amigos que agora, e em conjunto, se ajudem mutuamente a ultrapassar esse problema? E os filhos não lhes deram netos que possam preencher esse vazio?
Bem, toda a gente sabe que ter amigos verdadeiros é um tesouro. E um tesouro só tem valor porque é constituído com algo raro. E como se adquire esse bem raro? Uma resposta possível é: com tempo, sensibilidade e interesses comuns. A amizade, assim se chama esse bem raro, é algo que, no entanto, precisa de ser constantemente alimentada.
A vida, tal como hoje a conhecemos, é constituída por ciclos. No princípio o nosso mundo é a nossa casa, os nossos pais e familiares. Depois começa outro ciclo que se inicia com a creche, a pré-primária e a escola em geral. É uma fase de relacionamento fácil que, à medida que o ciclo avança e que nos damos conta do mundo em que vivemos, se vai tornado mais selectiva. É uma época propícia para criar verdadeiras amizades que se podem prolongar ao longo da vida. O ciclo termina com a passagem para o período activo laboral. Na primeira fase deste novo ciclo toda, ou quase toda, a nossa energia vai para o lançamento das nossas carreiras abrindo um espaço, quando abrimos, para constituir família.
Que acontece ao grande número de amigos que criámos na nossa juventude? Mudam de residência quer devido a terem casado quer devido aos seus deveres profissionais. Dispersam-se, arranjam novos pólos de interesse e, a sua nova vida absorve praticamente todo o seu tempo. Os contactos tornam-se menos frequentes e tendem a extinguir-se. Fica um número muito reduzido.
Mas a nova fase potencia novos amigos – os amigos do trabalho. Raros são, no entanto, aqueles que passam as fronteiras do trabalho e se transformam numa verdadeira amizade. Quando passamos ao ciclo seguinte – a reforma – e visitamos os nosso amigos no trabalho sentimos uma barreira, outrora inexistente, um desconforto que nos faz sentir, apesar do carinho com que nos tratam, que já não pertencemos àquele mundo.
Que importa, estamos na reforma. Temos o tempo por nossa conta, podemos fazer aquilo que sempre quisemos fazer e nunca tivemos disponibilidade. Podemos ficar na cama mais tempo, não estamos sujeitos a horários, nem a chefes chatos, nem a subalternos pouco colaborantes. Podemos viajar, podemos finalmente dedicarmo-nos aos nossos netos, podemos desfrutar mais assiduamente os nossos amigos e reatar as amizades antigas.
Tudo isto é verdade e no princípio até pode ser assim mas, com o tempo, começamos a sentir que falta algo. O que parecia fácil e aliciante começa a revelar-se como uma miragem. Com o progresso da medicina e do nosso nível de instrução começamos a sentir que ainda temos muito para dar, mesmo em áreas muito afastadas daquelas em que baseámos as nossas vidas. Queremos ser úteis, queremos aprender e ensinar, já não por obrigação ou objectivo de progressão nas nossas carreiras profissionais, mas pelo prazer de saber e partilhar. Os nossos amigos, os nossos netos, têm o seu lugar mas, assim como eles são pessoas com as suas entidades próprios, nós também o somos e queremos continuar a ser.
E cria-se um novo ciclo. Um ciclo em que queremos aprender e ensinar livremente, um ciclo onde podemos aplicar toda a nossa criatividade, todo o conteúdo de saber acumulado ao longo de décadas e obter novas experiências em outras áreas. Umas das estruturas criadas pela sociedade civil para este ciclo foram as “universidades seniores”. Estas organizações que, por enquanto são, a grande maioria, sem fins lucrativos destinam-se a estimular essas potencialidades, algumas delas desconhecidas pelos próprios, a obter novas amizades e apoios combatendo o flagelo da solidão e a conservar o físico e o intelecto activo proporcionando, assim, o agora denominado “envelhecimento activo”.
Estas são as razões porque considero importantes estas organizações. Não acha que são razões suficientes?
Vítor Manuel